"Publicada em 1969, a saga O poderoso chefão é, ainda hoje, a mais perfeita reconstituição das famílias mafiosas de Nova York. O carismático Don Vito Corleone é o chefão de uma delas. Apesar de implacável, Don Vito é, essencialmente, um homem justo. Padrinho benevolente, nada recusa a seus afilhados: conselho, dinheiro, vingança e até mesmo o assassinato de alguém. Em troca, o poderoso chefão pede apenas o respeito e a amizade de seus protegidos. Mas ninguém pode vencer as trapaças da idade. Quando todos os seus inimigos resolvem atacar, e seu bem mais precioso, a família, estiver por um fio, o velho Corleone terá de escolher, entre seus filhos, um sucessor à altura. Mario Puzo constrói, de maneira hábil, um mundo de intrigas, decisões cruéis e honra, num legado de tradição de sangue.
Autor: Mario Puzo
Gênero: Drama
Número de páginas: 462
Local e data de publicação: Rio de Janeiro, 2015
Tradução: Carlos Neyfeld
Editora: Record
Disputas sangrentas por poder
Existem alguns livros e filmes que por algum motivo, quando descobrimos que alguém nunca leu ou assistiu, perguntamos imediatamente: "Como você ainda não leu/assistiu?". Pois bem. Em relação a O Poderoso Chefão, eu sou a pessoa que aos dezenove anos ainda não tinha lido e nem assistido. Talvez a fama dos filmes ofusque um pouco o livro, tanto é que eu só soube da existência dele depois de assistir à resenha da Isabela Lubrano do Ler Antes de Morrer, e então minha curiosidade foi desperta. Comprei o livro assim que terminei de ver o vídeo, coisa que não faço com frequência. E, o mais impressionante: eu devorei quase quinhentas páginas em seis dias.
O livro acompanha ao longo de vários anos, a partir de 1945, a saga da família Corleone e da transição do cargo de Don desta Família, que Vito Corleone precisa passar para um de seus filhos. Os Corleone integram a Máfia Siciliana que domina a cidade de Nova Iorque junto a outras Famílias também de origem italiana e que disputam o poder político e econômico nesta e em outras cidades dos Estados Unidos.
Embora seja o líder da mais poderosa dessas Famílias, Don Vito Corleone sabe que há uma ameaça que ele não pode deter: a própria morte. Por isso, ele precisa escolher entre seus filhos Sonny, Frederico e Michael aquele que irá sucedê-lo no comando de seus negócios e de seus homens. Mas não é assim tão simples passar todo esse poder a um "herdeiro". Um Don precisa honrar e proteger sua família e seus afilhados, as pessoas a quem dá apoio; precisa ter cautela nos negócios, e nunca revelar o que realmente está pensando; precisa demonstrar autoridade e firmeza perante seus homens, senão não terá o respeito deles; mas precisa também ser justo e sábio.
Mas assim que os Corleone deixam transparecer uma fraqueza, seus inimigos vão se aproveitar para tentar tomar seu poder duramente conquistado e mantido ao longo dos anos. É então que os Corleone vão iniciar uma guerra sangrenta e extremamente violenta contra aqueles que ameaçam a Família e seus protegidos.
Este livro, escrito em 1969, é acima de tudo um grande retrato sobre a fragilidade da confiança que as pessoas têm nas instituições da sociedade. Sem a proteção necessária das autoridades, as pessoas recorrem a Don Vito Corleone para pedir favores, desde dinheiro emprestado até a punição para criminosos que não foram realmente condenados de forma legal. E, como um ciclo, a Máfia mantém seu poder porque a polícia, o funcionalismo público e outras instituições são corruptos. É um livro sobre violência, disputas por poder, contradições da sociedade e diferentes concepções de valores morais como a justiça.
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"Por isso, o próprio Don Corleone não estava zangado.
Aprendera havia muito tempo que a sociedade impõe afrontas que devem ser suportadas,
confortadas pelo conhecimento de que neste mundo chega o momento
em que o mais humilde dos homens, se conservar os olhos abertos,
pode vingar-se do mais poderoso."
Página 17
Narrado em terceira pessoa a partir dos pontos de vista de vários personagens, o livro é dividido em 9 partes, cada qual marcada pelos seus capítulos. Não é uma narrativa necessariamente cronológica ou linear, visto que existem diversas passagens de tempo, e que os acontecimentos não são contados estritamente na ordem. Há momentos em que primeiro os personagens ficam sabendo que certa coisa aconteceu, e que no capítulo seguinte é que o leitor tem todos os detalhes do fato, como às vezes é feito em roteiros de filmes. Esses "cortes" contribuem para o efeito dramático e nos levam a continuar lendo.
Os capítulos variam bastante de tamanho, e podem ir desde os bem pequenos até os muito longos. Quanto às partes que dividem a história, existe certa organização que justifica a importância da separação de tais "pedaços" da história. Em uma delas, por exemplo, conhecemos o passado de Vito Corleone, desde que ele partiu de uma pequena aldeia na Sicília para os Estados Unidos, relatando como ele se tornou um Don e adquiriu todo o respeito e prestígio que possui no tempo presente.
O livro é marcado por picos de ação e de "calmaria". De início, entendemos bem o que é o respeito que as pessoas tinham por um líder mafioso, e logo identificamos a famosa cena do filme em que Don Corleone se queixa do homem que lhe pede um favor sem lhe mostrar o devido respeito. Até eu, que não havia assistido aos filmes, conhecia essa cena, e assim que terminei de ler o livro me programei para maratonar os filmes. Logo após isso, os momentos de ação prosseguem enquanto Don Corleone atende a um pedido de seu afilhado Johnny Fontane. Em seguida, o ritmo rápido é quebrado, e o livro se torna meio arrastado. Isso acontece sempre entre um e outro pico de ação.
Além do foco nas disputas entre as Famílias da Máfia e a transferência do cargo de Don da Família Corleone, outros núcleos de personagens têm destaque, e estes também têm construção relativamente boa, embora eu acredite que o mais bem construído deles é Michael Corleone. Entre esses núcleos de personagens que fazem parte do círculo de afilhados dos Corleone, estão: Jhonny Fontane, um cantor e ator de Hollywood; Nino Valenti, amigo e antigo parceiro de Fontane; Lucy Mancini, madrinha de casamento de Connie Corleone; e Jules Segal, médico protegido pela Família. A existência desses núcleos nos dão uma outra dimensão da história, e nos levam a compreender a ambiguidade das atitudes dos homens da Máfia: são homens violentos e criminosos, mas fazem coisas boas para quem tem respeito por eles e lhes pede ajuda.
Minha única crítica em relação a esses personagens foi quanto à historia de Nino Valenti. Ele aparenta estar em depressão, e corre grande risco de morrer devido ao consumo excessivo de bebida; mas ele simplesmente não se importa; só quer beber até morrer. Pelo menos, é isso que seus amigos acreditam, porque em nenhum momento nós temos uma visão dele sobre como ele se sente em relação à sua vida. Existe sim um capítulo com o ponto de vista dele, mas é muito breve e não está ligado a esse problema que ele enfrenta. Eu acredito que o personagem seria melhor construído se nós pudéssemos conhecer os pensamentos e sentimentos dele em relação a esse problema. Isso poderia até mesmo contribuir para a dramaticidade da história, e poderia tirar um pouco a impressão de que Jhonny, Nino, Lucy e Jules são só pessoas vivendo a vida boa num hotel e cassino em Las Vegas.
O livro também tem como aspecto negativo alguns erros de escrita ocasionais, além da constante mistura de idiomas ao citar o nome da cidade "Nova York". Esse nome próprio é uma locução, são duas palavras com a função de uma só, e o certo seria manter as duas em inglês (New York) ou traduzir as duas (Nova Iorque).
Fora isso, é um livro muito bem escrito, com personagens surpreendentes e enredo incrível, que está muito bem-feito nessa edição de luxo da Editora Record. A capa é dura e a fonte do título é a mesma usada na capa dos filmes, com letras douradas brilhantes. As páginas são amareladas e relativamente grossas, e o tamanho da fonte no texto como um todo é ideal, sem incomodar quem tem problemas de vista.
Eu recomendo o livro para quem admira os filmes, para quem gosta de histórias com bastante ação e que estejam ligadas a crimes e violência. E também para quem, assim como eu, tem curiosidade com coisas novas.
Avaliação geral:
Onde comprar:
Aspectos positivos: os personagens são bem construídos e têm bom desenvolvimento, em especial Michael Corleone; os "cortes" da narrativa contribuem para a dramaticidade da história; a estrutura de poder da Máfia e seu caráter ambíguo são bem retratados.
Aspectos negativos: apresenta erros ocasionais; mescla o Inglês e o Português ao citar o nome da cidade de Nova Iorque; o personagem Nino Valenti deveria ter mais pontos de vista próprios a fim de que seus sentimentos e pensamentos ficassem mais compreensíveis ao leitor.
Por: Lethycia Dias
Caramba, que senhora resenha!! É exatamente esse o que eu li, é um tomo único, porém dividido. Confesso que li a resenha com aquela musiquinha do filme na cabeça. As cenas foram passando, e deu até vontade de comer o macarrão da senhora Corleone quando ela adota um dos meninos. Com suco de tomate!!Aquela cena é icônica, a do respeito! Quero reler este livro, mas preciso que me devolvam... Ah, você está ficando cada dia mais exigente!! Nunca tinha me tocado a respeito do Nova York. Essa edição está de babar.
ResponderExcluirÉ engraçado que esse livro parece ter sido escrito pra ser adaptado pro cinema! Eu até pesquisei um pouquinho sobre o Mario Puzo, pra saber se ele tinha escrito outros roteiros de cinema antes da adaptação do GodFather, mas parece que esse foi o primeiro... Tem algumas passagens que parecem cena de filme! Quando o Michael mata o capitão McClusky e o Solozzo, eu imaginei tudo como se fosse uma cena em câmera lenta, achei impressionante. Incrível como algumas pessoas conseguem unir dois talentos igual o Puzo fez com o livro e os roteiros dos filmes.
ExcluirA edição é maravilhosa mesmo. Quando fui comprar, vi várias edições, mas achei essa tão bonita! E basta o livro ser em capa dura pra me ganhar.
Menina, se você quer ver exigência, então sugiro que dê uma lida na minha resenha de amanhã...