"Reconhecido como um dos clássicos brasileiros do século XX, Erico Verissimo estreou na literatura em 1932 com o volume de contos Fantoches. Décadas depois, fez apontamentos manuscritos e ilustrações para a edição comemorativa do quadragésimo aniversário da publicação do livro. Nele, o escritor consagrado observa as narrativas do jovem principiante com olhar exigente, mas também com humor. Na primeira parte estão os fac-símiles das páginas de Fantoches anotadas por Erico. Escritos em forma de pequenas peças de teatro, os contos do jovem estreante já revelavam as qualidades que seriam desenvolvidas na maturidade. Quanto aos defeitos do principiante, o próprio Erico se encarregava de apontá-los e comentá-los. Depois de Fantoches, Erico só praticou o conto esporadicamente - e com maior domínio de suas técnicas. As seis narrativas breves incluídas na segunda parte deste livro revelam o engenho do criador de mundos e contador de histórias."
Autor: Erico Verissimo
Gênero: Conto
Número de páginas: 365
Local e data de publicação: São Paulo, 1997
Editora: Globo
Maturidade do autor, admiração do leitor
No meu último passeio pelos sebos de Goiânia, acabei de deparando com um verdadeiro tesouro: essa edição em capa dura de Fantoches e outros contos de Erico Verrismo. Eu estava trocando alguns livros que não queria mais, e acabei decidindo levar esse título para casa, embora estivesse muito interessada em outros. Isso porque eu tinha certeza de que não encontraria essa edição em outro lugar.
Erico Verissimo publicou seu primeiro livro na década de 1930, e essa foi uma reedição histórica publicada pela Editora Globo quando a publicação completava 40 anos. A essa altura Verissimo havia terminado de escrever o último volume de O Tempo e o Vento e já era um escritor consagrado, especialmente pelos seus romances urbanos, que foram considerados como parte da Segunda Geração do Modernismo Brasileiro.
A primeira parte do livro inclui os contos publicados em Fantoches, em versão similar à original, incluindo ilustrações e anotações feitas pelo autor décadas depois. As primeiras histórias de Verissimo são simples e curtas, sem muita profundidade e têm enredos bastante diferentes uns dos outros. Uma tentativa de reencenar a chegada dos Reis Magos à estrebaria onde nasceu Jesus Cristo; um homem assombrado pelo vulto de uma mulher que viu em um quadro; um grupo de personagens que, revoltados com o prosseguimento de sua história, se revolta contra o autor; um que se vê perseguido pela revelação do próprio passado; a morte de um poeta pobre e tuberculoso; um poeta invejoso que, mesmo morto, atrapalha seus concorrentes na literatura. Muitos desses contos estão escritos, de maneira curiosa, como se fossem peças de teatro.
A segunda parte contém histórias escritas posteriormente e que, portanto, não fizeram parte da versão original de Fantoches. Estas são mais maduras e profundas. Os pais de origem humilde que contemplam o sucesso do filho em seu primeiro recital e piano; um homem que, em delírio, morre acreditando realizar seu maior sonho; um homem velho que contempla a mudança do mundo e de pensamento das pessoas ao seu redor; um marido tomado pelos ciúmes pela esposa décadas mais jovem; um professor de piano que passa a viver entre o presente e o passado e se apaixona por uma aluna morta há anos; um homem que ao receber o diagnóstico de câncer, passa a confrontar sua realidade e as decisões que tomou durante a vida.
As vinte e uma histórias presentes em Fantoches e outros contos giram em torno de temas como a vida, a morte, o confronto de idéias e realidades, o amor, o passado, os dilemas comuns aos escritores. Embora abordados de forma nem sempre satisfatória para o leitor ou o próprio autor, os contos são uma boa maneira de investigar as influências de Erico Verrismo e constatar o desenvolvimento de sua escrita.
Imagem compartilhada no meu Instagram durante a leitura. Visite @lethyd ou @loucuraporleituras e acompanhe! |
"[...] o livro é e pouca ou nenhuma importância literária,
mas não deixará de ter um certo interesse histórico para quem quer que
(há gente para tudo neste mundo!) venha um dia
estudar em conjunto a obra do abaixo assinado."
Prefácio escrito por Erico Verrismo
Acredito que esse trecho do prefácio seja a melhor maneira de descrever esse livro. Pelo menos no que diz respeito à primeira parte, não se pode dizer que as histórias sejam incríveis, brilhantes, inspiradoras ou de leitura indispensável. Os contos que integram Fantoches são ingênuos; como diz o próprio Verissimo em um de seus comentários dos cantos de página: o autor tinha apenas vinte e seis anos! Então não se pode esperar desse livro toda a qualidade dos romances escritos anos e até décadas depois.
Mas é possível, mesmo em histórias tão simples, notar certos indícios dos temas, personagens e características presentes nos próximos livros do autor. Isso se dá de formas diversas: em alguns casos, eu fui capaz de reconhecer sozinha; em outros, só pude notar graças aos comentários. Aliás, afirmo que os comentários feitos por Verissimo na época da reedição são o melhor e mais importante aspeto desse livro. São eles que fazem muitas das primeiras histórias se tornarem interessantes e divertidas; e por meio deles, é como se o leitor conversasse francamente com o autor. Para alguém como eu, que lamento nunca ter tido a chance de conhecer Verissimo (afinal, a morte dele fazia mais de 20 anos quando eu nasci), as anotações são um prato cheio, uma maneira de se deliciar com a escrita de alguém que admiramos e ainda de investigar tudo o que o influenciou.
Talvez minhas palavras nessa resenha sejam suspeitas, porque tenho muita admiração por Verissimo, e acho que deixei isso bem claro no parágrafo anterior.
A segunda parte do livro apresenta histórias que se assemelham muito mais a alguns títulos famosos do autor, como Olhai os Lírios do Campo, Caminhos Cruzados, O Resto é Silêncio e O Tempo e o Vento. Isso se dá através da própria narrativa, bastante profunda e repleta de reflexões, ou talvez pela presença de um ou outro personagem que vive certo dilema. Impossível não contemplar Mário Meira Moura, de A ponte, sem pensar no médico Eugênio Pontes, de Olhai os Lírios do Campo. Uma diferença entre os dois? Um deles teve uma segunda chance...
Apesar de ter mais de 350 páginas, o livro pode ser lido rapidamente devido ao fato de os contos da primeira parte serem curtos e não preencherem muito espaço nas páginas - o que faz com que as histórias ocupem mais páginas do que deveriam. A primeira parte, por ser um fac-símile do livro publicado em 1932, conserva a ortografia da época. Isso pode ser um pouco confuso para quem está lendo, mas é fácil se acostumar às diferenças na escrita, que não modificam o sentido das palavras ou frases.
Apesar de ter mais de 350 páginas, o livro pode ser lido rapidamente devido ao fato de os contos da primeira parte serem curtos e não preencherem muito espaço nas páginas - o que faz com que as histórias ocupem mais páginas do que deveriam. A primeira parte, por ser um fac-símile do livro publicado em 1932, conserva a ortografia da época. Isso pode ser um pouco confuso para quem está lendo, mas é fácil se acostumar às diferenças na escrita, que não modificam o sentido das palavras ou frases.
O livro é uma ótima pedida para quem admira Erico Verissimo, principalmente por causa daquilo que podemos apreender a partir dos comentários deixados por ele. Me lembro de uma vez ter achado que a vaidade de Dr. Rodrigo com seu retrato em O Retrato (O Tempo e o Vento) o fazia semelhante a Dorian Gray (O retrato de Dorian Gray); pensem como fiquei empolgada no trecho em que Verissimo afirma ter lido Oscar Wilde! Outra grande descoberta para mim foi ter a confirmação de que o difícil relacionamento de Floriano (O Arquipélago) com seu pai, Rodrigo, era um reflexo da relação de Erico com seu próprio pai.
Essas são apenas algumas das coisas que percebi durante a leitura. Outra grande possibilidade deste livro é de nos sugerir novas leituras, afim de podermos investigar as influências do autor, que são bastante diversas.
As ilustrações e anotações de Verissimo estão nas margens no texto. Clique para ampliar! |
Recomendo este livro apenas para quem tem admiração por Verissimo, pois, como ele mesmo afirma, as histórias em si não têm muito valor; apenas aquilo que elas carregam é que pode ser considerado de grande riqueza histórica e literária. Como sei que essa edição só pode ser encontrada em sebos, estou indicando nos links para compra uma edição mais nova, publicada pela Companhia das Letras.
Avaliação geral:
Onde comprar:
Aspectos positivos: Traz comentários e ilustrações feitas por Verissimo na época em que o livro Fantoches foi reeditado em 1972; permite que o leitor recolha informações sobre o autor a partir de seus comentários, descobrindo mais sobre sua personalidade, influências e opiniões pessoais; a segunda parte do livro é composta por histórias mais elaboradas que se assemelham mais aos romances mais populares do autor.
Aspectos negativos: A ortografia antiga conservada na primeira parte do livro pode confundir o leitor.
Por: Lethycia Dias
Esse livro é o décimo que leio para o desafio Bingo Literário, na categoria "Escolhido pelo título".
Leth, parabéns pela resenha!! É tão difícil resenhar contos e você o faz com perfeição. Me interessei pelo conto mesmo sem ter lido nada do autor. Acho que é porque já amo as crônicas e contos do filho dele.
ResponderExcluirBeijos!
Muito obrigada, sua linda!
ExcluirAcho que é a prática, de tanto que leio contos! kkk
Na primeira vez que fiz isso, tive muita dificuldade mesmo, mas acabei me acostumando e criando o meu jeitinho pra falar se contos sem dar spoiler.
Eu recomendo que você leia qualquer coisa dele, sou super fã do Verissimo (acho que deu pra notar) kkkk