Confira!

"Nos últimos anos, poucas obras alcançaram no Brasil sucesso tão estrondoso quanto esta biografia de Olga Benario Prestes. Com simplicidade, sabedoria e grandeza, [o escritor] soube recriar um drama profundamente humano de nossa época. Entre a guerra desencadeada pelo nazismo e a miséria de uma ditadura latino-americana (com seus crimes característicos), Fernando Morais delineou a figura quase lendária de uma mulher que sempre empunhou o estandarte de ideais generosos. Este é um livro que conta a vida e a morte, que fala da beleza e da ignomínia - um livro verdadeiramente inesquecível." - Texto escrito por Jorge Amado.

Autor: Fernando Morais
Gênero: Biografia
Número de páginas: 321
Local e data de publicação: São Paulo, 2008
Editora: Companhia das Letras
Informações adicionais: Edição de bolso.


Mulher, judia, comunista: crimes imperdoáveis


Há três meses, publiquei aqui no blog um post listando livros que eu não costumo ler, e um dos itens citados eram as biografias. O motivo era que eu ainda não havia encontrado uma biografia de alguma personalidade que admirasse o suficiente para querer saber mais sobre sua vida. E eis que o universo me prega uma peça, e dou de cara com uma leitura obrigatória da faculdade, que por acaso era um livro que eu queria ler, mas que estava esquecido na minha longa lista de desejados. Eu já tinha ouvido falar da mulher judia e grávida de sete meses entregue aos nazistas pelo governo brasileiro, e queria saber mais sobre sua história. E, pela primeira vez, a leitura da faculdade coincidiu com minhas preferências pessoais.
Na próxima segunda-feira (27/06), eu devo apresentar um seminário sobre este livro. A leitura foi necessária porque o livro Olga é um livro-reportagem, fruto de uma investigação jornalística extremamente aprofundada. Fernando Morais é jornalista, e para escrever a verdadeira história de Olga Benario, fez um longo trabalho de pequisa em arquivos e documentos oficiais, livros, jornais, revistas e periódicos, além de ter tomado os depoimentos de 24 pessoas diferentes. O trabalho também incluiu viagens à Alemanha e aos Estados Unidos, além de viagens dentro do Brasil. Tudo isso já indica que não foi um livro simples de se escrever.
É difícil resumir uma biografia sem "entregar" todos os acontecimentos. Quando falamos da vida de uma pessoa que existiu de verdade, quem define o que é ou não "spoiler"? Tentarei resumir o contexto no qual Olga viveu e quais fatos fazem com que ela seja considerada uma heroína nacional na Alemanha.
Olga viveu entre 1908 e 1942. Nascida na Alemanha, ela era judia, e tinha uma vida confortável: seu pai, Leo Benário, era advogado. Entretanto, contrariando o que se espera de uma jovem de classe média, ela deixou sua família para entrar na militância local do Partido Comunista. Ela se destacava por sua vontade de aprender a teoria do comunismo, por sua dedicação na militância e por sua força de vontade. Logo, ficou muito conhecida entre os jovens alemães, e também entre os jovens russos (após um acontecimento que não posso revelar). Quando deixou a Alemanha para morar em um local de reunião de militantes comunistas em Moscou (URSS), em 1928, teve uma rápida ascensão nos setores internacionais do Partido.
Ela tinha ouvido falar de um jovem capitão do Exército que liderara no Brasil um grupo de rebeldes em marcha ao longo de 25 mil quilômetros, anos antes. O grupo, conhecido como Coluna Prestes, havia sido desfeito e não alcançara seus objetivos, mas seu líder, Luís Carlos Prestes, estava em Moscou, e acabava de entrar oficialmente para o Partido Comunista Brasileiro. Ele pretendia voltar ao Brasil e liderar uma insurreição, derrubando o governo vigente e instituindo o socialismo no país.
E por seu destaque na militância, no fim de 1934 Olga foi escolhida pelo Partido para acompanhar Prestes de volta ao Brasil, e com a ajuda de outros companheiros de ideologia, planejar e executar a "revolução comunista". Durante a viagem - que aconteceu com toda uma organização, pois Prestes era procurado no Brasil - ambos se envolveram. Já não era apenas a ideologia política que os ligava. Agora, tinham um relacionamento amoroso.
Não vou revelar como aconteceu a tal tentativa de "revolução", e nem o que aconteceu depois, mas preciso informá-los de que aquele era um período conturbado no Brasil. O governo vigente, de Getúlio Vargas, era autoritário e extremamente conservador, muito semelhante ao que hoje conhecemos sobre a ditadura militar. Desde 1926, Prestes era literalmente caçado, e o Partido Comunista era ilegal. No exterior, o nazifascismo crescia, Hitler tomava o poder na Alemanha, e já havia indícios de que uma guerra seria iniciada. E, para nossa maior decepção: o Brasil era intolerante, antissemita e também subserviente com a Alemanha e com a Gestapo, a polícia nazista.


"Este livro não é a minha versão sobre a vida de Olga Benario
ou sobre a revolta comunista de 1935,
mas aquela que acredito ser a versão real desses episódios."
Apresentação. Página 15.

Mesmo lendo o livro por obrigação, tendo que prestar mais atenção do que o normal para realizar o trabalho da faculdade, e tendo um prazo determinado, a leitura foi muito proveitosa e interessante para mim - e em certos momentos, até divertida, apesar da história trágica.
O livro é narrado em terceira pessoa, e apesar de ser uma história real, uma biografia, um texto jornalístico, é muito semelhante a uma narrativa ficcional. A narração começa não pela ordem cronológica, onde deveriam vir o nascimento, infância e adolescência de Olga, mas sim em um momento de grande ação, em Berlim, no ano de 1926. O próximo capítulo nos apresenta Prestes, em exílio, após o fracasso da Coluna Prestes. E então o tempo cronológico é retomado, desde o momento em que Olga decide entrar em um grupo clandestino de militantes comunistas, em Munique, no ano de 1923. A narração é feita em terceira pessoa, e Fernando Morais "desaparece" do texto, deixando que a história fale por si mesma. Nós quase acreditamos que aquele é um narrador comum de qualquer livro de ficção, e isso faz com que o texto tenha grande qualidade.
Talvez o início, que retrata os cenários da Alemanha, de Buenos Aires e da então União Soviética, pareça muito distanciado de qualquer realidade conhecida por nós. Nas primeiras páginas, nomes cuja pronúncia não conhecemos e locais dos quais não ouvimos falar podem tornar a leitura cansativa. Mas a partir do momento em que Olga e Prestes iniciam sua longa viagem em direção ao Brasil, e quando efetivamente chegam ao nosso país, a familiarização é muito maior.
Juntamente com a própria história de Olga, o livro apresenta também uma análise do cenário político e econômico no Brasil e na Europa. Antes da chegada de Hitler ao poder, a Alemanha já tinha ares de ditadura. E os rápidos relatos de como viviam trabalhadores comuns alemães dão uma ideia de como a crise econômica enfrentada pelo país após a Primeira Guerra causava sofrimento na população. Mais adiante, quando a narrativa retorna à Europa, podemos ver com clareza o holocausto (que começou antes da Segunda Guerra). No Brasil, um elemento importante a ser observado é o conservadorismo. Muito semelhante ao que ocorria nos anos 1960, havia grande preocupação em combater a "ameaça comunista". Era muito comum que pessoas sofressem perseguições por motivos políticos, e a polícia era abusiva (não foi apenas durante a ditadura militar que policiais cometeram torturas).
Talvez a grande quantidade de nomes citados (e sobretudo, de codinomes usados por Olga, Prestes e seus companheiros), possa causar certa confusão em um leitor apressado ou não muito atento. E quando estudamos a História do Brasil no ensino regular, não nos aprofundamos muito no período de 1930-1945, em que Getúlio Vargas foi presidente eleito e depois ditador. E com isso, podemos ficar um pouco perdidos com todas as denominações relacionadas à política, como os termos "aliancista" e "integralista". Mas a narrativa deixa claro quem é quem na política da época.
Além do texto corrido, são citados na narrativa diversas cartas, documentos oficiais e manifestos relacionados a Olga, a Prestes e ao contexto em que estavam inseridos. E, conforme eu descobri ao consultar a edição comprada por um amigo, Morais teve acesso também diversas fotografias dos "personagens" dessa história e dos locais onde ela se passa. Durante a leitura, nos damos conta do empenho de Fernando Morais em resgatar a história de Olga. Na apresentação de seu livro, ele relata que no Brasil havia muito pouco sobre ela, conforme o trecho a seguir: "[...] até mesmo a historiografia oficial do movimento operário brasileiro, produzida por partidos ou pesquisadores marxistas, relegara invariavelmente a ela o papel subalterno de 'mulher de Prestes' - e nada mais que isso". O maior mérito de Olga é com certeza colocar sob a luz a trajetória de uma mulher sobre quem não sabíamos quase nada, mostrando que ela era muito mais que a esposa de Prestes, a judia "dada de presente a Hitler", ou a "criminosa de alta periculosidade".
Recomendo essa leitura para quem se interessa por política, para quem gosta de História do Brasil, para quem se preocupa com movimentos sociais e para quem, assim como eu, tinha curiosidade sobre a história de Olga Benario.

Aspectos negativos: A identificação do leitor com o ambiente da história pode demorar a acontecer; as várias descrições de codinomes dos personagens e as relações políticas podem parecer confusas.
Aspectos positivos: O autor do livro não se faz presente na narrativa; o texto é muito semelhante ao de uma história de ficcção; são reproduzidos no texto diversos documentos comprovando tudo que é afirmando, e relatando com detalhes todo o processo político que influenciou os acontecimentos.

Decidi incluir nas resenhas do blog uma avaliação com estrelas. E você já deve imaginar qual a minha avaliação deste livro:



Por: Lethycia Dias

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